sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Peça ao Papai e à Mamãe


Há alguns anos uma empresa fabricante de bicicletas lançou uma campanha de publicidade com o slogan “não esqueça a minha bicicleta”. Criou um personagem de desenho animado com o qual as crianças se identificassem. O personagem, uma criança de aparentemente 8 anos, espalhava pela casa inteira bilhetes com o slogan da campanha para que seus pais os encontrassem. Nas semanas seguintes crianças de todo Brasil pediam insistentemente que os pais comprassem uma bicicleta, imitando a estratégia do personagem da publicidade.

Os pais, no ímpeto de atender seus filhos, compram tudo o que parece ser o desejo deles. Não imaginam como é fácil criar desejos nas jovens mentes. Quando seus filhos pedem determinado brinquedo podem estar apenas repetindo o que a publicidade mandou.

A criança é crédula, acredita em tudo e repete tudo. Assim, anunciantes utilizam técnicas que se favorecem da sua inocência, ingenuidade e credulidade. As crianças são vulneráveis à publicidade porque não têm formada ainda uma mentalidade crítica e nem a capacidade de discernir a verdadeira mensagem que a publicidade está transmitindo. Elas têm em casa um alto poder de persuasão sobre os pais. Ao confundir e impedi-las de distinguir a sua real necessidade do seu desejo, a publicidade favorece o consumismo desenfreado, ocupando a mente da criança com preocupações visivelmente desnecessárias. A preocupação em “ter” substitui qualquer outro interesse. Celebridades que associam seus nomes e imagens a produtos infantis contribuem para que as crianças entendam que somente serão mais talentosas e importantes como seus ídolos se possuírem os produtos que anunciam.

Muitos países já perceberam a lesão causada pela publicidade às crianças e adotaram rígido controle das campanhas dessas publicidades. Na Suécia é proibida qualquer publicidade destinada a crianças. Em outros países não se permite anúncios publicitários durante programas de público infantil. Na Austrália a propaganda não deve convencer que uma criança é menos importante ou saudável que a outra por ela não usar o produto anunciado. Assim como na Austrália, na Inglaterra e nos Estados Unidos expressões como “apenas” ou “somente” foram banidas das publicidades infantis para não confundir os menores sobre o preço. Nesses países, os publicitários são amplamente punidos se utilizam expressões como “peça a mamãe” ou “peça ao papai”.

Está comprovado que essas campanhas geram conflitos familiares intensos: filhos pedindo insistentemente algo que seus pais não podem ou não querem dar e pais que perdem a paciência com os filhos “pidões”. Toda criança tem o direito e a necessidade de brincar. O brinquedo deve ser apenas o instrumento disso. Mas crianças são facilmente convencidas de que elas precisam daquele brinquedo para ser felizes. Manipular a jovens mentes nesse sentido é algo cruel. E nós permitimos diariamente que nossas crianças estejam submetidas a essa crueldade.

Igor Britto
Professor de Direito do Consumidor
Pesquisador em Sociologia do Consumo

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