quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Dever de Informação do Consumidor Consciente

O texto abaixo ("Carne de Vitela) circula pela internet como autoria da Profª Maria de Lourdes Pereira Dias, da Universidade Federal da Santa Catarina.
Acredita-se que num futuro próximo os consumidores adotarão comportamentos de consumo mais conscientes, exigindo não só informações sobre as características e qualidades do produto, mas também sobre todo o seu processo de produção. Dominando todas as informações acerca da origem dos produtos que adquirem, os consumidores poderão optar por aqueles cuja produção geram os menores impactos ambientais e sociais.
Alguns valores adotados e preservados pela sociedade brasileira costumam ser duramente violados durante a fabricação de diversos produtos distribuídos no país. O texto trazido nesta edição trata de um produto rotulado por seu distinto sabor, e consumido por aqueles que buscam sofisticação nos seus atos de consumo. Mas a sua produção se faz pela intensa dor e terríveis maus tratos a jovens bezerros. Essas informações, sobre os meios de produção da carne de vitela e do baby beef, não serão vistas na publicidade desses produtos porque o seu conhecimento por parte da sociedade de consumo seguramente geraria imenso desgosto aos seus mais refinados consumidores.
A produção desse tipo de carne não combina com os valores de preservação ambiental e de piedade aos seres vivos, inerentes à grande maioria dos brasileiros, povo formado por uma duradoura cultura de boas relações com a natureza.



"Carne de vitela

A carne de vitela é muito apreciada por ser tenra, clara e macia...
Mas, o que pouca gente sabe é que o alimento vem de muito sofrimento do bezerro macho, que desde o primeiro dia de vida é afastado da mãe e trancado num compartimento sem espaço para se movimentar.

Esse procedimento é para que o filhote não crie músculos e a carne se mantenha macia. Baby beef é o termo que designa a carne de filhotes ainda não desmamados.

O mercado de vitelas nasceu com o subproduto da indústria de laticínios que não aproveitava grande parte dos bezerros nascidos das vacas leiteiras. Veja como é obtido esse 'produto': assim que os filhotes nascem, são separados de suas mães, que permanecem por semanas mugindo por suas crias.
Após serem removidos, os filhotes são confinados em estábulos com dimensões reduzidíssimas onde permanecerão por meses em sistema de ganho de peso alimentação que consiste de substituto do leite materno.
Um dos principais métodos de obtenção de carne branca e macia, além da imobilização total do animal para que não crie músculos, é a retirada do mineral ferro da sua alimentação tornando-o anêmico e fornecendo o mineral somente na quantidade necessária para que não morra até o abate.
A falta de ferro é tão sentida pelos animais, que nada no estábulo pode ser feito de metal ferruginoso, pois eles entram em desespero para lamber esse tipo de material.
Embora sejam animais com aversão natural à sujeira, a falta do mineral faz com que muitos comam seus próprios excrementos em busca de resíduos desse mineral.
Alguns produtores contornam esse problema colocando os filhotes sobre um ripado de madeira, onde os excrementos possam cair num piso de concreto ao qual os animais não tenham acesso.
A alimentação fornecida é líquida e altamente calórica, para que a maciez da carne seja mantida e os animais engordem rapidamente.
Para que sejam forçados a comer o máximo possível, nenhuma outra fonte de líquido é fornecida, fazendo com que comam mesmo quando têm apenas sede.
Com o uso dessas técnicas, verificou-se que muitos filhotes entravam em desespero, criando úlceras pela sua agitação e descontrole no espaço reduzido.
Uma solução foi encontrada pelos produtores: a ausência de luz; a manutenção dos animais em completa escuridão durante 22 horas do dia, acendendo-se a luz somente nos momentos de manutenção do estábulo.
No processo de confinamento, os filhotes ficam completamente imobilizados, podendo apenas mexer a cabeça para comer e agachar, sem poderem sequer se deitar. Os bezerros são abatidos com mais ou menos 4 meses de vida de uma vida de reclusão e sofrimento, sem nunca terem conhecido a luz do sol.
E as pessoas comem e apreciam esse tipo de carne sem terem idéia de como é produzida.
A criação de vitelas é conhecida como um dos mais imorais e repulsivos mercados de animais no mundo todo.
Como não há no Brasil lei específica que proíba essa prática - como na Europa - o jeito é conscientizar as pessoas sobre a questão.
Nossa arma é a informação!
Se souber o que está comendo, a sociedade, que não mais tolera violências, vai mudar seus hábitos.

Podemos evitar todo esse sofrimento não comendo carne de vitela ou baby-beef repudiando os restaurantes que a servem.
O consumidor (assim como o eleitor) tem força e deve usar esse poder escolhendo produtos, serviços e empresas que não tragam embutido o sofrimento de animais."

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

A Crise da Escola Particular

A notícia sobre o recém-criado cadastro de inadimplentes das instituições de ensino surge com grande polêmica na sociedade, e acompanhada de interessantes debates promovidos pela imprensa nacional. De um lado, os empresários do ramo educacional defendem a necessidade de se preservar um mínimo de segurança contra o risco da inadimplência. De outro, as associações de pais de alunos e os órgãos de defesa do consumidor consideram que o cadastro é um constrangimento ilegal aos devedores. Estamos diante de um acirrado conflito entre os interesses econômicos da atividade educacional privada e os interesses individuais de dignidade dos consumidores.

Para se posicionar neste debate é importante que o leitor conheça, além das duas realidades em confronto, os direitos em jogo. A existência dos cadastros de informações negativas de consumidores é permitida pelo Código de Defesa do Consumidor. A sua criação no Brasil serve para proteger uma economia em que o crédito representa cada vez mais o acesso ao consumo e para o desenvolvimento econômico do país. Seu objetivo é prevenir o fornecedor de crédito contra os consumidores com potencial para se tornar inadimplentes. Obrigar empresários a conceder crédito ou vender a prazo sem permitir que ele conheça o histórico do consumidor é empurrar a economia na crise mundial.

Entretanto, os cadastros de inadimplência, ao invés de serem utilizados como forma de prevenção, são utilizados como forma de coagir os inadimplentes a quitarem suas dívidas. A idéia é: “enquanto você não pagar o que me deve, não vai conseguir comprar em lugar nenhum”. E a vida de consumo do inadimplente se torna insuportável, impraticável e indigna.

Instituições de ensino estão proibidas por lei a tomar qualquer atitude pedagógica ou administrativa que constranja o aluno, e impeça ou prejudique o seu rendimento escolar. A única medida permitida à escola é se recusar a rematricular o aluno inadimplente no próximo ano letivo. Como é proibido reter o histórico escolar do inadimplente, se a escola se recusar aceitá-lo para o próximo ano, o aluno, ou seu responsável, pode se transferir para outra escola particular. Muitos são os alunos e pais que preferem procurar outra escola particular, ao invés de quitar a dívida. Esse débito provavelmente será cobrado em uma desgastante ação judicial ou recuperado mediante longas negociações, medidas nem sempre interessantes para a escola.

Esta é a razão pela qual a inadimplência nas escolas é mais alta do que em outros mercados de prestação de serviços. Impedir que a escola verifique o comportamento financeiro do aluno ou do seu responsável na escola anterior é colocar em cheque o serviço educacional privado. É afirmar que a iniciativa privada deve assumir os prejuízos da falência da educação pública sem qualquer garantia de segurança econômica, sem isenção de impostos e com altas obrigações trabalhistas. Essa foi a razão pela qual várias pequenas escolas tradicionais encerraram suas atividades no país nos últimos anos. Para elas se tornou impossível conviver com a inadimplência e com as rígidas obrigações tributárias. Se não houvesse escolas públicas a disposição de todos, a recusa justificada por uma escola em receber aluno inadimplente caracterizaria abuso contras os consumidores.

O fato de a escola pública ser pior do que a particular não é argumento para que esta última assuma todos os riscos da inadimplência. É melhor porque é remunerada pelos consumidores. E o fato dela lucrar não indica que ela deva assumir toda a obrigação do Estado. Ela deve lucrar para gerar recursos à sociedade capitalista. Por que ao invés de o Estado realmente aplicar os altos valores arrecadados em impostos para a educação em escolas com ensino de qualidade, transfere toda a sua obrigação para o ensino privado e impede que o empresário se previna para manter sua escola aberta?

Igor Britto
Professor de Direito do Consumidor
Pesquisador em Sociologia do Consumo

Teoria das Filas de Bancos

Os matemáticos comprovam: qualquer fila de banco, supermercado ou de serviços públicos obedece a teorias de probabilidade que levam em consideração o processo de chegada dos usuários, a distribuição do tempo de serviço, o número de usuários, a disciplina de atendimento e quantidade de atendentes. Ou seja, entre outras razões, quanto maior o número de usuários e menor o número de atendentes, maior será a fila e a quantidade de tempo que os indivíduos terão que esperar. Diversas são as leis matemáticas que confirmam isso: “lei de Little”, “lei do fluxo forçado” e “lei da demanda de serviço”.

Mesmo sem conhecimentos profundos das ciências físicas e matemáticas, qualquer consumidor brasileiro domina com vasta experiência prática todas essas teorias. Basta precisar ser atendido por um caixa personalizado de qualquer agência bancária do país. O tempo de espera é suficiente para refletir sobre todas as variáveis dessa equação. Além de desafiar as leis matemáticas, as instituições financeiras insistem em desafiar as leis jurídicas. Desde 2000 nenhum consumidor do Espírito Santo pode ser obrigado a esperar mais de 10 minutos em filas de bancos. De qualquer forma, todas as instituições financeiras deste Estado são obrigadas a instalar assentos adequados para que os consumidores aguardem sentados. Quem descumprir essa regra deverá indenizar os consumidores. É o que determina a Lei Estadual 6226, que nunca foi colocada em prática. Além dela, diversas leis municipais limitam o tempo de atendimento dos caixas de bancos em municípios do mesmo Estado, como Vitória, Serra, Cariacica (todas em 15 minutos), Vila Velha (20 minutos) e outros, com maior tolerância em vésperas de feriados ou em dias de pagamento de salários e vencimento de tributos. Para que os bancos consigam respeitar essas regras, basta cumprirem a risca as mais básicas teorias matemáticas: manter um bom número de atendentes e investir em processos rápidos e organizados de atendimento. Ao invés disso, cada vez mais os bancos diminuem os investimentos em recursos humanos e em programas de atendimento personalizado, mantendo as filas longas e desconfortáveis.

Os investimentos na tecnologia dos caixas automáticos ainda não resolveram esse problema. Para dificultar a situação dos consumidores, tem sido difícil (para não dizer impossível) um consumidor provar o tempo que permaneceu em uma fila de banco. Também é difícil para os Procons manterem fiscalização diária sob os bancos.

Itumbiara, um pequeno município de Goiás com 80 mil habitantes, resolveu essa equação. Por lei municipal, obrigou todas as agências bancárias instaladas no município a adquirirem máquinas que emitem senhas automaticamente. Cada máquina custa quinhentos reais ao Banco, e informa a hora da chegada do consumidor. Algumas agências do nosso Estado já utilizam modelos similares. Além disso, a lei de Itumbiara obriga todo atendente a carimbar, assinar e escrever na senha do consumidor a hora em que ele foi atendido. Com esse documento, o consumidor consegue provar quanto tempo esperou pelo atendimento e denunciar, se for o caso, a demora ao Procon e exigir na Justiça indenização estabelecida na lei. Todas as agências daquele Município se adequaram e não é mais necessário fiscalizar o cumprimento da lei. Senhores Deputados e futuros Vereadores do Espírito Santo, por favor, visitem a pequena Itumbiara em Goiás.


Igor Britto
Professor de Direito do Consumidor
Pesquisador em Sociologia do Consumo

Peça ao Papai e à Mamãe


Há alguns anos uma empresa fabricante de bicicletas lançou uma campanha de publicidade com o slogan “não esqueça a minha bicicleta”. Criou um personagem de desenho animado com o qual as crianças se identificassem. O personagem, uma criança de aparentemente 8 anos, espalhava pela casa inteira bilhetes com o slogan da campanha para que seus pais os encontrassem. Nas semanas seguintes crianças de todo Brasil pediam insistentemente que os pais comprassem uma bicicleta, imitando a estratégia do personagem da publicidade.

Os pais, no ímpeto de atender seus filhos, compram tudo o que parece ser o desejo deles. Não imaginam como é fácil criar desejos nas jovens mentes. Quando seus filhos pedem determinado brinquedo podem estar apenas repetindo o que a publicidade mandou.

A criança é crédula, acredita em tudo e repete tudo. Assim, anunciantes utilizam técnicas que se favorecem da sua inocência, ingenuidade e credulidade. As crianças são vulneráveis à publicidade porque não têm formada ainda uma mentalidade crítica e nem a capacidade de discernir a verdadeira mensagem que a publicidade está transmitindo. Elas têm em casa um alto poder de persuasão sobre os pais. Ao confundir e impedi-las de distinguir a sua real necessidade do seu desejo, a publicidade favorece o consumismo desenfreado, ocupando a mente da criança com preocupações visivelmente desnecessárias. A preocupação em “ter” substitui qualquer outro interesse. Celebridades que associam seus nomes e imagens a produtos infantis contribuem para que as crianças entendam que somente serão mais talentosas e importantes como seus ídolos se possuírem os produtos que anunciam.

Muitos países já perceberam a lesão causada pela publicidade às crianças e adotaram rígido controle das campanhas dessas publicidades. Na Suécia é proibida qualquer publicidade destinada a crianças. Em outros países não se permite anúncios publicitários durante programas de público infantil. Na Austrália a propaganda não deve convencer que uma criança é menos importante ou saudável que a outra por ela não usar o produto anunciado. Assim como na Austrália, na Inglaterra e nos Estados Unidos expressões como “apenas” ou “somente” foram banidas das publicidades infantis para não confundir os menores sobre o preço. Nesses países, os publicitários são amplamente punidos se utilizam expressões como “peça a mamãe” ou “peça ao papai”.

Está comprovado que essas campanhas geram conflitos familiares intensos: filhos pedindo insistentemente algo que seus pais não podem ou não querem dar e pais que perdem a paciência com os filhos “pidões”. Toda criança tem o direito e a necessidade de brincar. O brinquedo deve ser apenas o instrumento disso. Mas crianças são facilmente convencidas de que elas precisam daquele brinquedo para ser felizes. Manipular a jovens mentes nesse sentido é algo cruel. E nós permitimos diariamente que nossas crianças estejam submetidas a essa crueldade.

Igor Britto
Professor de Direito do Consumidor
Pesquisador em Sociologia do Consumo

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

É uma casa portuguesa com certeza

Atenção consumidor brasileiro,
as lições abaixo da Associação Portuguesa de Direito do Consumo podem ser muito bem aplicadas aqui no Brasil.
in Netconsumo.com

“COUVERT - pretexto para especulação?”

Num restaurante com nome, em Lisboa, esta semana, os comensais - em pleno Dia de S. Valentim - limitaram-se a consumir dois pães com a refeição.

A conta, no final, apresentava: pão e manteiga - 2 euros.

Os consumidores, por questão de princípio, interpelaram o empregado, ao que este ripostou: “aqui é assim - cobra-se sempre o pão e a manteiga, ainda que só se coma o pão!”.

O que é de estranhar porque também veio queijo e não se consumiu, tendo sido de imediato devolvido; também, sem solicitação expressa ou implícita, vieram algumas embalagens de pasta de sardinha, de atum e queijo fundido que retornaram à copa. E, no entanto, o restaurante não se propôs cobrar todos os acepipes recusados.

Neste particular, não são os usos comerciais que fazem lei. É a lei expressa que tem de ser observada com todo o rigor.

A aposição dos acepipes na mesa - sem prévia solicitação - pode configurar, como sucede no caso, um ilícito. Vide o n.º 4 do art.º 9.º da LDC - Lei de Defesa do Consumidor:

O consumidor não fica obrigado ao pagamento de bens ou serviços que não tenha prévia e expressamente encomendado ou solicitado, ou que não constitua cumprimento de contrato válido, não lhe cabendo, do mesmo modo, o encargo da sua devolução ou compensação, nem a responsabilidade pelo risco de perecimento ou deterioração da coisa.

A história do “pão com manteiga” configura uma “venda casada ou ligada”. Será que tais práticas só ocorrem por ignorância das leis ou porque os consumidores bem apessoados que frequentam o lugar desprezam assim 400$00 dos antigos que - num universo de 2000 consumidores/mês - perfazem nada mais, nada menos do que 800 contos ilicitamente arrecadados?

Será coisa de somenos? Que o não ignorem os operadores económicos. Para que possa haver alguma decência neste como noutros processos.

apDC – associação portuguesa de Direito do Consumo -
Mario Frota

terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

A Agência Reguladora que não sabe regular

No último dia 13 entrou em vigor a Resolução nº 477 da Anatel com novas regras para o sistema de telefonia móvel brasileiro.

Nos poucos dias que sucederam sua vigência, institutos de defesa do consumidor entraram em conflito com a Anatel ao interpretar dispositivos da nova regulamentação. O conflito de interpretações soa como uma crítica da sociedade consumidora. Enfim, as novas regras favoreceram ou não o consumidor?

A discussão maior se deu na interpretação dos artigos 25 e 40 da Res. 477. A Anatel considera que se a operadora de telefonia pode exigir a fidelização do consumidor ao plano contratado, desde que lhe ofereça algum benefício, como um aparelho celular gratuito ou uma quantidade mensal de minutos para utilização. Neste caso, se aceitar, o consumidor deverá manter-se vinculado a este plano durante o período determinado no contrato. Por outro lado, os organismos de defesa do consumidor afirmam que o consumidor está livre para mudar de plano a qualquer momento, mesmo que tenha recebido algum benefício da operadora. Nestes casos, para o IDEC e o Procon de São Paulo, a empresa poderá apenas exigir que o consumidor mantenha-se vinculado a ela, podendo mudar de plano a qualquer momento.

A nova regra da Anatel é muito clara ao proibir qualquer vínculo do consumidor a qualquer plano das operadoras seja qual for o benefício concedido.

O vínculo permitido pela regra é aquele que “prende” o consumidor à empresa por determinado período, e não a um plano de serviço desta empresa.

Provavelmente não haverá discussão quanto a isso. As operadoras poderão oferecer benefícios para que os consumidores se mantenham fiéis à empresa, mas jamais poderão ficar presos a planos de tarifas, de mensalidades ou condições pré-determinadas. O consumidor é livre para mudar de plano a qualquer tempo, mas dentro de uma mesma operadora, se aceitar o benefício oferecido pela empresa.

O que poderá gerar verdadeira confusão entre consumidores, operadoras e órgãos de defesa do consumidor é a nova regra para bloqueio ou desbloqueio dos aparelhos celulares. Até então, a prática comum das operadoras era vender aparelhos bloqueados para habilitação de outras empresas. Ou seja, a prestadora X vendia aparelhos telefônicos que só funcionavam se habilitados para ela própria. Um consumidor não conseguia habilitar esse aparelho para usar uma linha telefônica de empresa concorrente.

Foi então que a “Oi” utilizou como estratégia de marketing e de captação de clientes da concorrente, o desbloqueio gratuito de aparelhos celulares. Instalou atendimentos em diversos locais públicos onde técnicos desbloqueiam gratuitamente aparelhos celulares de qualquer consumidor.

A estratégia pode ser eficaz numa fase de mercado em que não há mais novos consumidores de celulares. São mais de 160 milhões de usuários no Brasil. A única estratégia de crescimento atual é “roubar” clientes da concorrência.

Pelo que se sabe, a Oi é a única operadora que adota explicitamente a prática do desbloqueio gratuito de aparelhos celulares.

O que quis dizer a ANATEL? Vender aparelhos bloqueados ou não é uma faculdade da operadora? O usuário deve ser informado da faculdade dos bloqueios ou da faculdade de alteração dos bloqueios?

A única verdade que se pode ter é que fica proibida a cobrança por serviços de desbloqueios dos aparelhos celulares. Mas o consumidor pode exigir que ele seja desbloqueado? E de quem é essa obrigação?

Provavelmente o mercado se auto-regulará e em breve todas as operadoras terão serviços gratuitos de desbloqueios de celulares para conseguir captar os clientes da concorrência. E após isso, fabricarão todos seus aparelhos desbloqueados, pois o bloqueio perderá qualquer efeito em pouco tempo.

Mas enquanto as operadoras não adotarem a mesma estratégia da Oi, como ficam os consumidores que desejarem mudar de plano? Poderão exigir desbloqueio gratuito?

A Anatel leva a crer que nenhuma operadora é obrigada a desbloquear aparelhos celulares, mas se o fizerem, deve ser um serviço gratuito. O que torna essa regra completamente inócua.

O direito do consumidor exigir o desbloqueio do seu aparelho celular fará mais sentido a partir de Agosto de 2008 quando terá liberdade total para migrar de uma prestadora a outra e ainda assim manter o mesmo número. Isso fomentará ainda mais a migração de clientes entre prestadoras. Espera-se que até lá a questão do desbloqueio dos celulares já esteja resolvida ou pela Anatel ou pelo mercado de telefonia.

Enquanto isso a Oi continua utilizando uma estratégia suja e ilegal de conquista de novos clientes. Criou um “movimento popular” denominado “Bloqueio Não” pelo qual incentiva os consumidores brasileiros a comprarem apenas aparelhos desbloqueados. Agora, incentiva que os consumidores exijam o desbloqueio por parte das suas prestadoras.

A Oi instalou quiosques em diversos locais públicos em nome do movimento “Bloqueio Não”. Criou um site do movimento e em nenhum lugar se encontra o vínculo existente entre o suposto “movimento popular” e a empresa.

Essa prática é expressamente vedada pelo Código de Defesa do Consumidor. Fere os mais básicos princípios da publicidade, pelos quais “a publicidade deve ser veiculada de tal forma que o consumidor, fácil e imediatamente, a identifique como tal”.

O que a Oi tem feito é publicidade camuflada. Induz os consumidores a acreditarem que existe realmente um movimento popular, quando na verdade por trás disso há o interessa da maior operadora de telefonia do Brasil em conquistar clientes das suas concorrentes.

Os menos desavisados aguardam as ações dos órgãos de defesa do consumidor.

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Em Portugal as raposas entraram no galinheiro

APDC contra formação em publicidade aos alunos dos primeiro e segundo ciclos antes da formação

(In www.netconsumo.com 15-02-2008)

A Associação Portuguesa de Direito do Consumo (APDC) criticou hoje o Governo por «esquecer» a formação dos alunos enquanto consumidores e fazer parcerias com os anunciantes para ministrar técnicas de publicidade ao 1º e 2º ciclos.

Em comunicado, a organização diz que a partir do próximo dia 20 aqueles alunos vão receber formação em «educação para a publicidade», no âmbito do programa Media Smart, promovido pela APAN - Associação Portuguesa de Anunciantes.«Mas já alguém viu confiar-se a guarda da 'capoeira' à 'raposa'?
O Ministério da Educação, em vez da educação para o consumo que deveria introduzir institucional e curricularmente, faz parcerias destas contranatura com os anunciantes a quem interessa que a publicidade dirigida aos menores não saia de cena», sublinha o documento.A APDC sustenta que com este tipo de opções «não há qualquer profilaxia, antes se adensa a promiscuidade», frisando que a educação para o consumo «é algo de imperativo que o Estado tende a ignorar, já lá vão mais de 25 anos, após a primeira Lei de Defesa do Consumidor editada em Portugal».Recorda que o artigo 6º dessa lei consagra que «incumbe ao Estado a promoção de uma política educativa para os consumidores, através da inserção nos programas e nas actividades escolares, bem como nas acções de educação permanente, de matérias relacionadas com o consumo e os direitos dos consumidores, usando, designadamente, os meios tecnológicos próprios numa sociedade de informação».Acrescenta que, no número 2 desse mesmo artigo se atribui a tarefa ao Estado, às Regiões Autónomas e às autarquias locais de «desenvolver acções e adoptar medidas tendentes à formação e à educação do consumidor designadamente através da concretização, no sistema educativo, em particular no ensino básico e secundário, de programas e actividades de educação para o consumo».«Não se pode embandeirar em arco por se dispor a APAN a enredar as nossas crianças neste embuste», conclui a APDC.
Em declarações à agência Lusa, em Setembro último, o director-geral da Inovação e Desenvolvimento Curricular, Luís Capucha, afirmara que o Media Smart pretende «dotar as crianças de um maior conhecimento e sentido crítico em relação aos temas e conceitos da comunicação comercial de marcas e entidades, ao mundo da publicidade».
Por: José Carlos Fernandes Pereira
Associação Portuguesa de Direito do Consumo
Colaboração do Prof. Mario Frota

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

Volkswagen Fox: você ainda vai perder um dedo

Há algumas semanas foi divulgada pelo Estado de São Paulo a notícia de que proprietários do veículo Volkswagen Fox tiveram seus dedos mutilados ao movimentar o encosto traseiro do veículo.

O Fox possui uma trava de metal fixada no seu banco traseiro criada para movimentar o assento aumentando o espaço do bagageiro. O problema é que essa trava de metal tem um formato de argola e quando manuseada diretamente, sem o auxílio de uma alça presa à trava, funciona como uma guilhotina. A trava é capaz de prender com forte impacto o dedo do usuário causando sérias lesões.

Oito pessoas sofreram mutilações e outras tantas se feriram gravemente. No total, 22 pessoas tiveram unhas e peles arrancadas e dedos esmagados ou decepados, conforme registrou o jornal O Estado de São Paulo (http://www.estadao.com.br/economia/not_eco120960,0.htm).

Assista as imagens de como ocorrem os acidentes no Youtube, em reportagens da Globonews e da Bandeirantes:
Órgãos de Defesa do Consumidor investigam o caso

A Fundação Procon de São Paulo e o IDEC notificaram a Volkswagen para prestar esclarecimentos sobre as denúncias dos danos causados aos proprietários do Fox.

A princípio a empresa alegou em nota oficial que os acidentes "ocorreram durante operações que não seguiam as indicações do Manual do Proprietário, e em situações diversas, sem um padrão entre elas". Após a pressão dos órgãos de defesa do consumidor a Volks enviou à imprensa a nota abaixo:

Comunicado
Tendo em vista as recentes reportagens publicadas na imprensa sobre o sistema de rebatimento do banco traseiro do Fox, a Volkswagen do Brasil vem reiterar aos seus clientes que a operação desse sistema é segura, bastando seguir corretamente as instruções contidas no Manual do Proprietário.
Com a certeza de que não existe problema com o sistema e que não se trata de caso de "recall", a Volkswagen, que acima de tudo respeita o compromisso assumido com a satisfação de seus consumidores, informa que, a partir da próxima semana, irá oferecer para todos os clientes que ainda tenham dúvidas a instalação gratuita de uma peça adicional que evita eventuais erros na operação de rebatimento do banco traseiro do Fox. Esse serviço poderá ser realizado em toda a Rede Autorizada de Concessionários Volkswagen.
Com relação à diferença entre os modelos do Fox vendidos no Brasil e na Europa, esclarecemos que o banco do Fox europeu é bi-partido e exigiu uma solução técnica diferente. O Fox brasileiro com banco bi-partido possui o mesmo sistema do europeu.
Volkswagen do Brasil

A empresa publicou no seu site instruções de como os usuários devem proceder para solicitar a instalação da nova peça (http://www.vwbr.com.br/VWBrasil/Noticia/?id=502575). A Volkswagen também utilizou o Youtube para explicar aos seus clientes como manusear corretamente o rebatimento do Fox (http://www.youtube.com/watch?v=ZNt1phECdPY).
Dessa forma, a Volks considerou que estava insenta de realizar o recall, ou seja a convocação expressa e em massa de seus clientes para sanar imediatamente o problema do veículo.
O Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor – DPDC do Ministério da Justiça instaurou processo administrativo nesta quarta-feira, dia 13, para apurar as possíveis infrações da Volkswagen às normas de consumo. A empresa terá 10 dias para apresentar defesa, conforme despacho abaixo publicado no Diário Oficial da União, página 26:
DEPARTAMENTO DE PROTEÇÃO E DEFESA DO CONSUMIDOR
DESPACHO DO DIRETOR
Em 12 de fevereiro de 2008

No- 12/DPDC/SDE. - Protocolado no- 08012.006857/2006-18. Representante: Presidência da República. Representado: Volkswagen do Brasil Ltda. Adoto a nota supra como motivação. Ante os indícios de infração ao disposto nos artigos 4º, I; 6º, I, III e VI; 10 e 31, todos do Código de Proteção e Defesa do Consumidor, e na Portaria n. 789/01, do Ministério da Justiça, nos termos do artigo 50 da Lei n 9.784/99, acolho a nota elaborada pela Coordenação Geral de Assuntos Jurídicos (fls.), cujo relatório e fundamentação passam a fazer parte da presente decisão, e determino a instauração de processo administrativo no âmbito deste Departamento, notificando-se a empresa Volkswagen do Brasil Ltda. para apresentar defesa, na forma do disposto no artigo 44 do Decreto n. 2.181, de 20 de março de 1997. Determino, por fim, a expedição de ofício, nos termos do artigo 106 da Lei n. 8.078/90, aos Ministérios Públicos, aos Procons Estaduais e Municipais de Capitais e ao Fórum Nacional das Entidades Civis de Defesa do Consumidor, com cópia da presente decisão, para conhecimento e providências que entenderem pertinentes. Publique-se.
RICARDO MORISHITA WADA



Lei determina o recall

Se a Lei for aplicada com rigor, a Volkswagen do Brasil poderá ser multada em até R$ 3 milhões. Motivos não faltam.

O Código de Defesa do Consumidor estabelece que produtos que comprometam a saúde e integridade física do consumidor não poderão ser colocados no mercado. Este é um direito de toda sociedade de consumo e está previsto entre os direitos básicos do consumidor.

Não há o menor cabimento nas alegações da Volkswagen que os danos causados são de responsabilidade dos consumidores que não seguiram à risca o manual de instruções do Fox. As imagens demonstram claramente os riscos que correm os proprietários deste modelo. E se o fabricante não soubesse disso não disponibilizaria uma forma mais segura para a realização do rebatimento do banco traseiro do veículo, como tem feito.

Se existe uma forma de manuseio mais segura a empresa deveria tê-la adotado desde o planejamento inicial do veículo. É óbvio que o fabricante ao afirmar que pode instalar uma peça adicional para evitar eventuais erros na utilização do produto, está reconhecendo que há um erro de projeto, e que o veículo poderia garantir mais segurança do que oferece atualmente.
Na Europa outras medidas preventivas foram adotadas pela fabricante em tempo hábil.

Há uma necessidade urgente de um recall. E a Volkswagen deve realizá-lo imediatamente, não por estratégia de marketing ou porque os órgãos de defesa do consumidor lhe informaram, mas porque A LEI DETERMINA.

São duas as graves infrações ao CDC por parte da Volkswagen. A primeira foi colocar no mercado de consumo um produto que acarreta risco à integridade física dos consumidores (artigos 6º, I, 8º e 10). A segunda foi não informar de forma clara e bastante ostensiva que o procedimento de rebatimento do banco traseiro do Fox é de extrema periculosidade (artigos 6º III, 9º e 31).

O próprio CDC determina que caso o fabricante do produto, depois de colocá-lo no mercado, tomar conhecimento de sua periculosidade deverá informar imediatamente às autoridades e a todos os compradores, bem como reparar o defeito, neste caso, um erro de projeto (artigo 10, § 1º e 12).
Os proprietários do Fox que sofreram algum dano na realização do rebatimento do banco traseiro devem imediatamente exigir uma reparação pela empresa na Justiça. Em São Paulo diversas pessoas estão movendo ações judiciais contra a Volkswagen e seguramente sairão vencedores.
A Volkswagen do Brasil está ignorando completamente as normas de defesa do consumidor e demonstrando total desrespeito aos seus consumidores.

Igor Rodrigues Britto